A perspectiva aberta por Husserl

Quando leio um livro que se propõe a fazer uma análise seja de um dado histórico, seja de um evento político que eu não conheça tão bem quanto o autor, eu simplesmente faço uma leve abstração da exigência dos dados apresentados, presumo que sejam verdadeiros e executo a leitura concordando com tudo quanto leio. Só mais tarde, num prazo indefinido, quando minha cultura sobre o tema for aumentando, eu retomo aos poucos àquele conteúdo analisado e consigo com mais propriedade saber o que pode estar certo e o que pode não estar.

A coisa se torna mais acentuada ainda quando se trata da leitura de uma análise filosófica de um filósofo que eu só conheço por nome. Então, por esse motivo, vou me abster neste texto de tratar do assunto relacionado ao conteúdo estrito de “Edmund Husserl contra o psicologismo”, coisa que qualquer um pode vir a conhecer pela leitura da sinopse ou do livro mesmo, e vou expor algo que me parece, isto sim, uma contribuição pessoal, ainda que ínfima, ao novo livro publicado do professor Olavo de Carvalho. Em vez de apenas resumir porcamente um conteúdo que se apresenta muito melhor no original e fingir domínio sobre um conteúdo que eu desconheço e que eu, literalmente, descobri uns dias atrás, vou então partir do princípio de que ele esteja certo e olha para a forma e a estrutura em que esse novo livro se encaixa no total da obra do professor.

            Pois “Edmund Husserl contra o psicologismo” soma na obra do professor não apenas pelo acréscimo quantitativo de mais um assunto novo entre tantos temas abordados, mas também pela perspectiva de situação concreta que o livro fornece, onde é possível ver através das aulas a cujas transcrições fazem referência algumas sementes do que mais tarde o professor vai apresentar nos livros “Uma Filosofia Aristotélica da Cultura” e “O Jardim das Aflições.”

            Para isso, é necessário manter em mente ao longo da leitura a situação e a data precisas que o livro registra. Ali está documentado não um texto de próprio punho, mas um registro direto de uma exposição oral realizada pelo professor, e essas aulas foram ministradas entre 1992 e 1993, ao mesmo tempo em que o Aristóteles e o Jardim estavam sendo preparados. A sobreposição da preparação dos dois livros às aulas sobre Husserl indicam que se pode tirar proveito destas para uma maior compreensão daquelas, pois o professor já vinha preparando aqueles dois livros quando ministrou essas aulas, e continuou nessas preparações após o seu término, aproveitando ali naquelas preleções, de forma germinal, as reflexões que mais tarde ele apresentaria de forma mais completa.

            Ali já estão apresentadas, num diálogo concreto com a filosofia de Husserl, a Teoria dos Quatro Discursos que será explicada em “Uma Filosofia Aristotélica da Cultura” e algumas reflexões sobre Epicuro que constituirão a base de “O Jardim das Aflições”. E assim, “Edmund Husserl contra o psicologismo” nos demonstra, retroativamente, com um documento que remete à exposição prática das aulas, a síntese concreta e viva daquilo que antes, baseado em dois volumes distintos, o leitor só podia fazer recorrendo à própria imaginação e ao mesmo tempo ajuda a ver os passos que antecederam o Aristóteles e o Jardim.

            Mas o livro também fornece um algo a mais. Ele fornece, para quem vem tentando analisar a obra do professor, a experiência de ver se expandir subitamente o campo de referências práticas da sua filosofia, coisa que antes se supunha já encerrado nos livros publicados até então, e assim confirmar experiencialmente aquilo que o próprio professor já ensinou: os livros publicados de um filósofo não encerram a sua filosofia.

            Sei bem que essa exposição está meio confusa, mas não faz mal. Não pretendi de jeito nenhum encerrar o assunto aqui, quis apenas expressar umas primeiras impressões – elas mesmas ainda confusas – para a partir delas caminhar para uma investigação mais bem elaborada e então obter resultados mais esclarecidos.

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