Imagem: Reprodução

O culto à polidez e a vitória dos vagabundos

Quando encontramos um grande professor, devemos não apenas ter humildade e paciência para aprender com ele, mas também – e sobretudo – atenção para as grandes e eternas lições que ele nos passa. E note bem que essas grandes lições não devem ser aprendidas como são aprendidas tudo o que esse professor nos ensina, tal categoria de ensinamentos devem receber um processo mais demorado de reflexão e internalização, de modo que sejam verdadeiros norteadores de toda sua atitude no decorrer da vida. Esse processo passa necessariamente, por exemplo, pela constatação da perenidade da sua veracidade. O professor que a passa, não a traz de si mesmo, mas nos mostra como aquilo foi também para ele uma importante lição, aprendida com gigantes ainda maiores que ele.

Eu não iria escrever aqui até finalizar a transcrição e edição de uma entrevista que fiz com a Dona Regina, diretora do Externato Duque de Caxias, uma escola conservadora com uma história maravilhosa. Mas a recente novela Bebiânnica e seus inacreditáveis desfechos me forçam a escrever algumas breves reflexões, das quais acredito poder tirar aprendizados valiosos.

Quando ontem, dia 19 de fevereiro de 2019, o programa Os Pingos nos Is recebeu Gustavo Bebianno para dar sua versão dos fatos sobre toda a celeuma sobre a história dos vazamentos; com Augusto e Felipe claramente favoráveis a Gustavo, o elogiando desde o início, com uma introdução honrosa repleta de louvores à sua integridade e idoneidade, e sem nenhum aperto (nem de leve, como apontou corretamente Leandro Ruschel em sua conta no Twitter) durante todo o programa, eu tive certeza que Felipe Moura Brasil, apesar da inegável contribuição dada ao reaparecimento da voz conservadora no Brasil, parece não ter aprendido a grande lição de seu professor, nosso grande professor, Olavo de Carvalho.

Se tem uma coisa que Olavo nos ensinou, não apenas como conteúdo explícito de suas aulas e de sua filosofia, mas com sua própria vida – a exemplo de Sócrates – é que a condição sine qua non para uma vida intelectualmente honesta e frutífera é o total desprendimento dos amores deste mundo. O intelectual só alcança determinados patamares de conhecimento na exata medida em que, no bom português, não dá a mínima para quem quer que seja, não se sente obrigado a prestar satisfação a ninguém, apenas ao próprio Deus. E uma consequência inescapável disso é saber exatamente até onde vai sua educação, sua polidez, seu bom mocismo. A dosagem, por sua vez, deve ter como fiel da balança, exatamente o seu compromisso com a verdade acima de qualquer coisa, entendendo que Verdade é um dos atributos principais de Deus. E eu, particularmente acho (talvez por influência direta do próprio Olavo) que quanto mais tempo você dedica a ser um rapaz educadinho, limpinho e cheirosinho; quanto mais cuidado você tem cuidado em escrever de modo a não ofender os mais sensíveis (que a cada dia mais se multiplicam), menos você conseguirá fazer esse balanceamento, e mais suscetível estará a negociar a verdade em favor de interesses outros.

Quem ouvia o True Outspeak sabe do que estou falando. O véio não poupa palavrões, apesar de constantes (constantes mesmo) apelos para sua diminuição. Engraçado que, quando o Padre Paulo Ricardo, um sacerdote conservador e tradicionalista (sem nenhuma conotação ruim nesta palavra), participou do programa, ele nem sequer mencionou os palavrões, quem o fez foi o próprio Olavo, em tom de brincadeira, quando disse que aquele foi o programa com menos palavrões que ele já fez, o que fez com que o Padre desse gostosas gargalhadas. Além de não reclamar, Padre Paulo recomendou fortemente o programa, do qual se disse fã número um.

Não que o palavrão seja algo necessário à vida intelectual, claro que não. O que é necessário é chamar as coisas pelo nome que elas têm, na intensidade que seu ânimo no tratamento do assunto exija. O que Olavo chamaria de “uma bela merda” ou mesmo “uma putaria”, Padre Paulo chamaria de “porcaria”, “nojeira”. Mas nos dois casos, não há eufemismos no combate contra o mal.

Felipe Moura Brasil sempre foi o cara educado, contido, e polido. Fazia questão de se manter isento e assepticamente técnico sobre tudo o que dizia. Eu o acompanho com certa regularidade e sempre vi essa tendência. Por exemplo, quando ia no programa Pânico, sempre era chamado de Lord, ou outro apelido que destacasse sua nobreza e altivez. Eu sempre dizia que esse cuidado extremo para demonstrar moderação poderia lhe ser prejudicial. Quando respondia a ataques de jornalistas vagabundos que queriam tacar-lhe a pecha de defensor do Bolsonaro, ele invariavelmente fazia sua defesa alegando seu compromisso com fatos, com independência etc. Ora, o professor nunca deu – e nunca orientou que se desse – esse tipo de respeito a salafrários travestidos de profissionais respeitáveis. Não raro, a resposta a muitas dessas chatices era o bom e velho “vai tomar no cu”, que era “o máximo de caridade que eu posso ter com você”, dizia Olavo.

De fato, numa guerra você não pede licença para atirar em ninguém e nem pede desculpa quando o inimigo cai. E se você, que está lendo essas linhas acha mesmo que não estamos numa guerra, que isso é exagero, hipérbole neurótica, ou – o pior de todos – teoria da conspiração, você realmente não está entendendo nada. Está morto (ou até ajudando o seu próprio inimigo) e ainda não se deu conta. E numa guerra cultural, não se responde a uma calúnia com uma autoafirmação elogiosa. Isso é a regra 001! Se alguém te chamar de nazista, você não responde: “olha, eu sempre gostei muito de judeus, tá bom? Sou uma pessoa comprometida com os direitos da população judia.”.

E qual é o problema de se manter nesse culto à polidez? É que você acaba cedendo. Você inverte a ordem de importância e passa a ter a sua imagem de pessoa correta, isenta e impecável como mais importante. É o que eu percebo ter acontecido com esse grande jornalista que é (ou ao que parece, foi) o Felipe. É o passo a passo da desgraça: começa apostando na isenção tecnocrata não afetada por nenhuma ideologia; evolui para um culto exagerado, quase neurótico, dessa mesma imagem; e acaba por servir de ajuda aos inimigos de tudo aquilo contra o que você sempre lutou.

É exatamente essa atitude que não só o Olavo, mas todos os conservadores americanos de verdade acusaram os republicanos: uma frescura que prejudica não só os interesses do partido, mas dá força para que a esquerda cresça, beneficiada pela guerra assimétrica, arrasando todas as estruturas da sociedade e perpetrando seu projeto revolucionário destruidor e demoníaco. É o truque mais velho de todos. Enquanto a gente não perder o medo, não haverá esperança para o Brasil. E a coragem não tem outra fonte senão o constante desprendimento daquilo que Cristo chamou de “os cuidados deste mundo”. Nós que somos conservadores temos que nos preocupar em agradar uma única pessoa: Nosso Senhor Jesus Cristo, o qual nos será por advogado diante de Deus Pai quando no último dia Ele nos exigir contas das nossas obras e dos talentos que nos deu.

Espero que o Felipe Moura Brasil relembre essas lições eternas do nosso grande professor. Sua contribuição a todos nós foi inestimável, e seria muito triste perder esse que era uma luz na escuridão da grande mídia.

Gostou desse artigo? Apoie o trabalho do Burke Instituto Conservador virando um assinante da nossa plataforma de cursos online.

As posições expressas em artigos por nossos colunistas, revelam, a priori, as suas próprias crenças e opiniões; e não necessariamente as opiniões e crenças do Burke Instituto Conservador. Para conhecer as nossas opiniões se atente aos editoriais e vídeos institucionais

Igor Moreira

Igor Moreira

Editor do Burke Instituto Conservador. Professor e palestrante.

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp
Compartilhar no email
Email

Comentários

Relacionados