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Bandido bom é bandido morto?

Há uma compreensão errônea na sociedade brasileira que relaciona justiça com anseios transloucados de justiceiros; tal compreensão torna-se ainda mais incorreta na medida que associam o conservadorismo com qualquer anseio à parte do estado de direito. Quando o mantra dos conservadores se torna: “bandido bom é bandido morto”, devemos nos questionar se o conservadorismo à brasileira não está se tornando exatamente o despotismo que criticamos nos revolucionários.

A égide da reta justiça, aos moldes ocidentais, alicerçada no Direito Natural, ética cristã e democracia, não está sob a posse de um Estado, líder ou qualquer indivíduo que se autoproclame salvador social; muito menos está a dignidade e o direito à vida de quem quer que seja, sob os julgamentos de um ou mais justiceiros sociais. Tal composição: Direito Natural, ética cristã e democracia, são os elos que configuram quaisquer agrupamentos humanos que nutrem o mínimo de organização comunitária e senso ético no Ocidente. Numa sociedade em que o bandido não possui dignidade — e aqui não se confunda dignidade com vantagens sociais —, é uma sociedade fadada ao caos. Eu explico o porquê.

O bandido, antes de ganhar tal alcunha, é detentor de direitos basilares por ser um ser humano, independente do que ele tenha feito — eis, inclusive, a garantia que os defensores do nascituro primordialmente arrogam: a dignidade da vida humana anterior a quaisquer outras atribuições sociais, jurídicas ou filosóficas. Salvo, é claro, em caso de legítima defesa.

Tal disposição de direitos antecede quaisquer atitudes que posteriormente podem condená-lo à prisão e ao desapreço social. Tal garantia possui sentido, e é justamente um aparato antidespostismo, se considerarmos ser a justiça um instituto social gerenciado por homens falhos, que eventualmente podem chancelar num indivíduo o título de bandido sem que de fato ele o seja. Grave já seria prender um inocente, matá-lo, então, seria “imperdoável”. A vida de um inocente é intocável; podemos ser ainda mais incisivos e dizer que é o maior bem que as instituições do Estado têm ao alcance de suas mãos. Por isso, numa reta visão de sociedade, sob uma correta compreensão que respeita os avanços do direito e da compreensão político-filosófica do Ocidente — pilares do conservadorismo, diga-se de passagem —, acompanha a ideia de que “bandido bom é bandido preso” e não morto. Afinal, o conservador não é um déspota, mas um articulista de raro esmero social que possui em seu estojo de ações a firmeza de suas convicções arraigadas nas evoluções éticas do Ocidente; assim como na prudência da percepção de que somente os sábios — já calejados na forma do tempo — podem ostentar em seus atos as verdadeiras práticas equilibradas que tornou o legado do Direito tão frutífero e indispensável.

Poderíamos discutir a brandura ou o enrijecimento das penas, concordemos até com a prisão perpétua em casos específicos em que a comunidade se veria constantemente ameaçada pela soltura do infrator. Todavia, dar a liberdade para que indivíduos matem — em seu próprio nome ou em nome do Estado — sem uma reta retaguarda jurídica que obedeça o direito natural de legítima defesa, é o mesmo que dar ao Estado e aos justiceiros a liberdade de vida e morte dos cidadãos que eles — por seus meios e entendimentos — julgarem culpados. É exatamente a mentalidade que nutre os abortistas e os revolucionários, por exemplo, colocando o Estado ou seus egos ideológicos como pilares das vidas dos cidadãos, e não os cidadãos como condição para a existência dos Estados e de suas políticas específicas. O direito positivo fazendo às vezes do Direito Natural.

Temos, pois, dois extremos que são igualmente toscos em suas conclusões: 1- os que acreditam que o desencarceramento compulsório, unido a qualquer pedagogia utópica, ajudará a sociedade a se ver livre dos males dos crimes hediondos; 2- noutro lado temos os que acreditam que matando bandidos num ritmo de série de Netflix gerará qualquer paz social para além do medo e da inconstância jurídica.

O conservador preza pelas instituições bem formadas, aquelas que nos trouxeram até aqui com relativa seguridade social, jurídica e filosófica. O papel de anarquistas, aqueles que atuam a seu bel-prazer à parte dos pilares que arregimentam a comunidade, não passa nem perto daquilo que todos os grandes conservadores sempre defenderam.

Uma sociedade sensata, que planta seus princípios e atos no solo adubado da prudência, não se furta da graça que é possuir uma organização jurídica robusta, porém, condizente com a polis e a moral que de maneira milenar ela conduz em seu bojo.

Se a polis requer um regramento criminal mais pesado, em busca de segurança para a sua população, que o faça, que a prisão se torne um recanto de penitência daqueles que quiseram colocar as regras e a segurança social em risco. Todavia, matar em nome de uma moral fantasmagórica que surge do ego e de demais vícios individuais, com certeza não é o caminho e nem devia ser uma possibilidade numa sociedade ordeira que confia em seus pilares de sustentação.

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Pedro Henrique Alves

Pedro Henrique Alves

Filósofo, colunista do Instituto Liberal, colaborador do Jornal Gazeta do Povo, ensaísta e editor chefe do acervo de artigos do Burke Instituto Conservador.

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