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A doutrinação nas escolas para além das conspirações

Quando falamos de doutrinação, temos a tendência de fantasiosamente imaginar um professor com uma “pinta” quase que satânica dentro de uma sala de aula, esfregando as mãos sob um olhar demoníaco, imaginando como ele fará para capturar mentes infantis e adolescentes pra seu plano maligno de dominar o mundo.

A doutrinação a qual nos referimos quando tratamos de educação, não é algo minuciosamente delegado por um comitê central, como os que haviam na URSS; a doutrinação — ou “pedagogia ideológica” — atua através de um entrave de princípios, desenvolvimentos históricos e ideológicos que vão muito além das conspirações e achismos de tradicionalistas.

 

Um cronograma breve:

Karl Marx, ao fim de sua vida, principalmente ao elaborar o seu conceito de alienação, passa a perceber que focar as forças revolucionárias somente no campo econômico e político se tratava de uma perda de tempo, afinal, o arrimo da sociedade ocidental, aquilo que mantinha ela unida numa mentalidade moral e prudente — percebe ele em Origem da família, da propriedade privada e do Estado —, era uma cultura de ação e pensamento que transpassava a história do Ocidente; hoje sabemos que tal cultura ocidental são: os valores judaico-cristãos, a filosofia grega e o Direito romano. Tal estrutura ocidental se encontrava numa união medular com os indivíduos; tudo na cultura ocidental — até mesmo pós-revolução francesa — levava a esses postulados.

O marxista Max Horkkeimer então, num ensaio intitulado Autoridad y Familia, encontra o elo que faz com que os indivíduos não se desprendam desse tronco moral ocidental; o elo seria a família, a igreja e a escola. Para o filósofo é esse tripé que faz a manutenção da mentalidade cultural conservadora na realidade; o marxismo assimila essa percepção que jaz dispersa em inúmeras obras que seguiram do seio marxista original.

A escola — una-se aqui as universidades e todos os meios que compõe o “ser escola” —, como uma das fontes primordiais da sociedade; ela passa então a ser invadida por teorias que preparam o campo social para a desconstrução do elo moral que mantém o Ocidente, com suas várias mazelas, bonanças, diferenças e peculiaridades, sob uma mentalidade de princípios naturais que norteavam o bom e o belo. Tenhamos em mente que a ligação entre as universidades e sociedade propriamente dita, se dá na dependência dessa última em manter um constante renovo de princípios intelectuais, interpretações e conhecimentos instrumentais sobre como atuar no cotidiano.

 

A ação:

Muitos polos de desenvolvimentos ideológicos surgiram desde então, todos eles mais ou menos alinhados no sentido de desmontar o sistema ético/moral tradicional do Ocidente. E a essa máxima, sequer podemos usufruir da alcunha de “conspiracionistas”, nem mesmo tais ideólogos escodem ou mascaram tal fim almejado.

A Escola de Frankfurt e a sua teoria crítica, assim como os desenvolvimentos filosóficos do desconstrucionismo de Derrida, adentraram principalmente na filosofia jurídica, pedagógica, filosofia política e moral de quase todos os países que se deixaram tomar por intelectuais dessa leva de mentalidade. Quase todas as teorias desenvolvidas a partir dessas estruturas são tomadas no Brasil como fonte para demais entendimentos. Os professores, principalmente da área de humanas, se encharcam de seus pressupostos para depois transmiti-las em releituras e reinterpretações a seus alunos.

Não obstante, era preciso “contaminar” a mentalidade acadêmica com um princípio comum, e aqui jaz o real problema. Tais teorias frankfurtianas ou desconstrucionistas fazem parte de um momento posterior ao dogma da luta de classes. Mas antes deixemos claro: nunca que estudar as teorias desconstrucionistas ou a própria teoria crítica da Escola de Frankfurt serão um problema em si. Um conservador que cria um Index Librorum Prohibitorum não passa de outro doutrinador. Não há conhecimento proibido para mentes sadias e livres!

A questão é que fizeram de tais fórmulas ideológicas verdadeiros dogmas, ou seja, ideias e valores filosóficos que não podem ser transpostos e que devem permear toda a visão da realidade; aquilo que denomino de: “hermenêutica do todo”. Tal dogma se trata, em suma, da luta de classes em suas mais diversas facetas e porquês de existir.

 

O óculos dogmático:

É preciso pontuar o problema macro. A visão de luta de classes, defendida por Marx e adotada como motor da realidade, continua sendo o motor das interpretações progressistas até hoje. Aqui jaz o óculos comum de quase todos os docentes criados na mentalidade progressista: a luta de classe em seus vários modelos.

A luta de classes se remodelou em várias espécies e máscaras, do tradicional embate de proletários x capitalistas, temos hoje os transsexuais x héteros; ricos x pobres; mulheres x homens; filhos x pais; para cada molde de luta de classes, temos uma frente ideológica que se amolda às suas lutas. A luta de classes se torna então uma espécie de éter que compõe a própria realidade, não sendo possível respirar, andar, pensar e opinar sem nela tocar de alguma maneira; se torna o óculos pelo qual todos nós olhamos e interpretamos a realidade.

Nada está fora desse universo criado a partir da ideologia, tudo, absolutamente tudo está impregnado dessa realidade e nela se compõe. É isso que acontece nos anos de criação de professores nas universidades, uma imersão do estudante numa mentalidade sufocante, porém uma mentalidade que dá propósito e respostas — ainda que simplórias — às realidades verdadeiramente aporéticas da comunidade.

Como os futuros docentes foram criados numa mentalidade única, não sendo permitido o contraditório para além das ridicularizações e comentários dos críticos igualmente progressistas e igualmente encharcados da mentalidade acima denunciada, a universidade — ou a escola — oferece uma suposta “universalidade de conteúdos”; todavia, todo o conteúdo ali composto é abordado através da “hermenêutica do todo”, isto é: a luta de classes. A universalidade de conteúdos não passa, então, de um espólio necessário para uma defesa posterior; um abonar de consciências para que um dia haja na ementa curricular um suposto contraditório que nunca fora de fato estudado em sua essência crua, ou seja, não enviesada.

 

As vítimas:

Os professores são tão vítimas quanto arrogamos ser os alunos, justamente porque foram antes alunos; eles foram criados num mundo onde os professores eram imbuídos de levarem os alunos a serem revolucionários, e não meramente conhecedores de matérias basilares para a formação de mentes autônomas. Tais professores, forjados sob um mundo criado à imagem e semelhança de ideologias, vivem eternamente bêbados de uma única interpretação da realidade.

Ao abrirem um livro qualquer, os seus arcabouços intelectuais que deveriam servir de suporte instrumental para julgar os axiomas ali expostos, em sua nudez mais íntima se revela ser tão somente a velha e necrosada luta de classes posto como princípios inconteste de interpretação; nesse momento, esse pobre ser só poderá observar tal escrito através desses postulados costurados em suas córneas.

Aos professores — aqui colocados de maneira geral, mas obviamente guardamos a realidade de que nem todos aqui se encaixam — foram negados os diversos instrumentários, composições e pontos de vistas. Ao erigirem primeiro o dogma socialista e progressista para depois apresentar as opções conhecimento, apenas DOUTRINARAM e não ENSINARAM. Uma reta educação cria nos alunos uma liberdade real para o desenvolvimento de suas capacidades críticas através de uma exposição verdadeira de ideias. Negar as premissas dos conhecimentos ocidentais, assim como minar a educação moral naturalmente delegada aos pais, é o mesmo que sabotar a escada pelo qual estamos todos subindo.

A escola é um local de aprendizado intelectual, não de moldagem moral; mas sob o marxismo não há tal diferenciação, como diriam marxistas e fascistas: não há nada fora do Estado.

 

Conclusão:

A doutrinação não é uma realidade tão fácil de ser percebida. Apesar de podermos elencar casos, imagens, gravações e vídeos; sem entender as raízes do problema ficaremos num debate tolo sobre os sintomas, podemos até recair no erro do extremo contrário. Isto é: achar que devemos criar uma doutrinação conservadora via escolas públicas para aplacar o erro progressista.

A dita doutrinação não cabe exatamente nesse postulado, a não ser que compreendamos toda a trama que envolve esse problema acima exposto; como tal trama ainda permanece oculto à grande maioria, prefiro, pois, o termo “pedagogia ideológica”, pois a grande maioria dos professores que doutrinam sinceramente não se percebem como tais doutrinadores. Para eles, estão tão somente exercendo sua função de criar uma mentalidade social para o progresso, e para isso é preciso despertar consciências, agregar pressupostos modernos, e recusar velharias morais.

A revolução se revela um eterno parricídio, as vítimas criam a próxima geração vítimas; são gados que criam gados para que eles próprios conduzam os seus semelhantes ao matadouro.

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As posições expressas em artigos por nossos colunistas, revelam, a priori, as suas próprias crenças e opiniões; e não necessariamente as opiniões e crenças do Burke Instituto Conservador. Para conhecer as nossas opiniões se atente aos editoriais e vídeos institucionais

Pedro Henrique Alves

Pedro Henrique Alves

Filósofo, colunista do Instituto Liberal, colaborador do Jornal Gazeta do Povo, ensaísta e editor chefe do acervo de artigos do Burke Instituto Conservador.

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