"Masculinidade Tóxica"

Superman, Fiuk e Vitão: traços primitivos do homem contemporâneo

Superman, Fiuk e Vitão: traços primitivos do homem contemporâneo

Por que há um ataque coordenado contra a masculinidade? Por qual razão a mentalidade de nossa época estimula um sentimento de culpa entre homens por alguns dos males sociais que perturbam determinados grupos? Por qual motivo seres humanos do sexo masculino se veem acuados por pressões ideológicas? O que faz com que homens não se sintam bem por serem homens?

Sem exageros, existe uma boa dose escatológica nessas perguntas. Afinal, se somos produtos da união de homens e mulheres, a “criminalização” de um dos lados desta moeda biológica pode ser um prenúncio do fim dos tempos. Mas, sem dramas. Sobreviver em meio ao caos inclinando-se ainda mais para o caos é típico da raça humana.

Uma das razões simplistas e amplamente difundidas para essa caçada ao tipo “homem” é a suposição de que suas condutas ao longo da história foram de opressão sobre grupos vulneráveis. Se a história é contada pelos vencedores, os homens, por ocuparem postos de prestígio nas mais diversas comunidades do Ocidente, acabaram por criar uma narrativa histórica que privilegiou seus interesses. Mas, não são quaisquer homens: são aqueles heterossexuais, brancos e com determinados traços econômicos e sociais que lhe permitem poder político. Ou seja, todos (todas, “todxs”, “tod@s” e “todes”) que não se enquadram naquele estereótipo foram excluídos dos processos de participação social que conferem dignidade. Essa é, mais ou menos, a história que o esquerdismo contemporâneo narra, conduzida na ponta de lança do feminismo.

Assim que essa linha de raciocínio está devidamente solidificada no imaginário social, não há como escapar da teia argumentativa que sucede. Ou seja, frente aos privilégios que aquele tipo de homem ainda goza, resta a luta. Em outras palavras, ações devidamente orientadas a desenraizar essa cultura machista e patriarcal devem ser implementadas, sob pena de perpetuação do mal.

Se antes a guerra entre os sexos era uma simplória brincadeira entre homens e mulheres para saber quem pilotava melhor um veículo, hoje tais indivíduos tiveram suas trincheiras devastadas, seus muros derrubados e seu império saqueado por hordas feministas. A cisão entre os sexos gestada por ideologias, exclui do horizonte a complementariedade dos opostos. Com uma fissura que responsabiliza o homem branco, heterossexual, privilegiado (e por que não, conservador), pelas barbáries do mundo, a única alternativa é a desconstrução de um modelo que desrespeitou continuamente alguns grupos sociais.

Confundindo propositalmente a virilidade com violência e a masculinidade com massacre, o progressismo plantou a semente que disseca o terreno fértil da prosperidade social para que o deserto ideológico ocupe o vasto território da racionalidade. Mesmo que a crítica sempre esteja resguardada da falsa premissa de que somente comportamentos “tóxicos” são os grandes alvos do feminismo, seus mentores têm a clara noção de que essa “nuvem de fumaça” serve como um grande guarda-chuva ideológico que abarca todo o posicionamento masculino que o humor do momento assim declarar como nocivo. Em outras palavras, “tóxico” não são necessariamente os excessos que podem ser facilmente detectados em determinadas atitudes por parte de homens, mas sim o que em um dado momento, de acordo com as circunstâncias da volúpia do abnegado ativista, podem ser classificadas, de acordo com o seu sentimento, como tais.

Em meados de 2018, o Superman, digo, o ator e galã Henry Cavill que interpreta aquele super-herói em alguns filmes, declarou que estava com medo de flertar pela possibilidade de ser acusado de estupro. Em entrevista para a revista GQ Australia, ele declarou que “[…] é muito difícil fazer isso [cortejar] se tem certas regras em vigor. Porque aí é como ‘Bem, eu não quero ir para cima e falar com ela, porque vou ser chamado de estuprador ou algo assim’. Então, você fica tipo ‘Esqueça. Vou ligar para uma ex-namorada em vez disso e depois voltar a um relacionamento que nunca funcionou de verdade’. Mas é muito mais seguro do que me jogar no fogo do inferno, porque sou alguém que está sob os olhos do público, e se eu for e flertar com alguém, quem sabe o que vai acontecer?”. O ator ainda complementou que havia algo de “maravilhoso” e “tradicional” no fato de uma mulher levar cantadas e ser perseguida, mas que havia um grande problema contemporâneo que seria o fato de não poder insistir nesses atos quando uma mulher diz “não”, sob pena de poder ir para a prisão. Ou seja, qual o limite da insistência em uma tentativa de contato amoroso? Se tudo é assédio, o próprio assédio perde o sentido…

Após inúmeras críticas por parte de usuários do Twitter, Cavill pediu desculpas “por qualquer confusão ou mal entendidos” e que “não tinha a intenção de ser insensível”. Se até o Superman não se sente seguro em flertar e cortejar uma mulher, tendo que pedir desculpas por não querer causar nenhum embaraço com suas palavras, imagine o cidadão comum.

Por falar em pessoas “comuns”, dentro de uma “realidade comum”, nas últimas semanas o ator Fiuk, filho do célebre cantor-galanteador Fábio Jr., ganhou holofotes por sua sensibilidade masculina aflorada (ou aflorada masculinidade sensível?). Em meio a um desentendimento no reality show Big Brother Brasil (BBB), Fiuk fez a típica representação do homem moderno. Diante de um contexto em que uma participante (a psicóloga Lumena) ficou incomodada com outros homens maquiados encenando uma espécie de desfile de forma pejorativa, ela declarou que tal postura ofendia e significava violência contra suas amigas “trans” e travestis. Bem, entre mortos e feridos, todos os que se envolveram deram razão a Lumena e pediram desculpas. Fiuk foi além: se desconstruiu enquanto homem. Se “trans” e travestis estão em um processo de repaginação de sua percepção de mundo, Fiuk sentiu-se inspirado e ressignificou o papel do homem contemporâneo.

Assim, o ator declarou com as mãos unidas quase que em um gesto de oração: “Infelizmente, quem causa isso tudo, que é uma responsabilidade que talvez você tenha que assumir, são os homens brancos privilegiados, velho. Somos nós, que vai atrás, que bate, que maltrata muita gente, que impõe muita coisa. Então, é um lugar que a gente precisa ouvir. E a gente precisa aprender. […] É entender o nosso lugar de fala: a gente é branco, a gente é homem, a gente é hetero, a gente é privilegiadasso, cara”. E, dessa forma, em razão de uma brincadeira que simplesmente satirizava comportamentos, Fiuk ganhou holofotes.

Em primeiro lugar, “velho”, em sua fala, não inclui a terceira idade. Para os mais desatualizados, é uma gíria “pequeno-burguesa-malandra” que acaba por poupar os que estão mais curtidos pelo tempo. Com isso, Fiuk não está ofendendo os velhos (claro que se algum velho se sentir ofendido, Fiuk vai pedir desculpas e chorar… assim espero!). Em segundo lugar, quando ele começou a falar o trecho “que vai atrás”, ele chorou. Foi um choro um pouco melodramático e forçado, mas foi um choro. Em terceiro lugar, o ator não poupou sua proximidade com o progressismo e adotou o “lugar de fala” como salvaguarda protetiva para tentar mostrar como está ajustado no novo estereótipo de homem. Por fim, aqui vem o problema central: Fiuk atribui os problemas do mundo ao homem branco, heterossexual e privilegiado. O ator, encarnando o homem frágil contemporâneo e não satisfeito com seus sapatos de cristais, passou a pisar em ovos e sensibilizou-se com algumas cascas que foram quebradas.

E aqui não se desconsidera a existência de privilégios. Ora, eles existem e são muitas vezes aleatórios! E dependendo do ponto de vista ou das circunstâncias, eles podem ser absolutamente antagônicos ao que o senso comum progressista imagina. Também não se está vendando os olhos a fatos atrozes contra determinados “grupos” de pessoas: é fato que existem homens que batem em mulheres, que desprezam e agridem homossexuais ou que são racistas. Negar isso é negar o óbvio. Mas também é muito claro que isso não constitui uma herança genética e social compulsória a todo brasileiro branco, heterossexual e “privilegiado”, apesar do coro estridente esquerdista afirmar o contrário por necessidade marxista: sempre deve existir um opressor para chamar de “seu”; logo, neste momento, é o homem branco, heterossexual, “cis”, conservador, cristão, “privilegiado”… Aliás, a própria ideia de “lugar de fala” é um totalitarismo filosófico: somente aqueles que pertencem a um grupo ou se colocam no “lugar” deste grupo e pensam de acordo com o progressismo estão aptos a representar a “verdade” de tal grupo; os demais seres humanos, por não participarem daquela realidade, devem aceitar e se calar. Obviamente, quando um membro do grupo vitimizado não reproduz o discurso esquerdista, ele não é integrado no “lugar de fala”…

Mas, da ocorrência de situações violentas reais não se pode construir uma generalização. Lembrando que foi divulgado nas redes sociais que Fiuk fez “aulas de militância” com uma professora de história que lhe explicou (doutrinou?) sobre body shaming, feminismo, construção imagética de padrões de beleza e autonomia feminina. Tudo isso para ingressar bem preparado no BBB. E, dentro da “casa mais vigiada do país”, ele fez bem a lição de casa ao culpar os homens, indistintamente, pelos males do mundo. Uma observação merece ser feita: a professora de Fiuk, Laís Roberta, conhecida como “Robertita” declarou que em suas aulas particulares existe uma diferenciação: “para pessoas brancas eu cobro hora/aula. Para pessoas pretas é de graça”. Inverta a cor da pele na hora da cobrança e imagine o burburinho…

Como a marcha para o progresso não para, sempre há uma ressonância digna de registro. Um cantor de nome Vitão, mais conhecido como o namorado da Luísa Sonza, que é ex-esposa do youtuber e humorista Whindersson Nunes (momento “Fofocalizando”!), declarou recentemente em seu Twitter que “às vezes (muitas vezes) dá vergonha de ser homem”, enfatizando o quanto certo “aprendizado” é necessário para alterar uma cultura masculina nociva. Bem, Vitão é mais um a cumprir uma agenda com base em abstrações generalizantes. Sem apontar o dedo para problemas concretos com responsabilidades reais, apela para uma “vergonha de ser homem” como a salvação linguística que pode influenciar a sociedade. Sem especificar, sem analisar a natureza masculina e sem pensar, Vitão é outro que engrossa as fileiras da milícia frágil contra a masculinidade tóxica.

Para além destas constatações, existe algo de curioso: se existe uma cultura que intoxica a mente dos homens e isso é paulatinamente ensinado no processo de formação de meninos ao longo dos anos no Ocidente, seriam homens chorões ou que reclamam no Twitter, aqueles que protegeriam a sociedade das crueldades de indivíduos tóxicos. Ou seria o receio do Superman uma dolorida constatação de uma época que já sucumbiu a uma fragilidade masculina que é herdeira de um imaginário social no qual a conquista, o flerte, a perseverança, a virilidade e o senso de dignidade não passam de um severo reacionarismo?

Sem titubear, os homens estão sob ataque. Não existe alarmismo ou excessivo drama. É a realidade. Sob a alegação de que somente algumas atitudes “tóxicas” são criticadas, os progressistas sabem que a reestruturação de um sistema social passa pelo ataque integral a todos que se enquadram na tradição, seja ela nociva ou não. Portanto, eis o motivo de homens heterossexuais e brancos serem tão atacados.

Claro que homens “sensíveis” nos moldes esquerdistas, homens “feministos” ou homens adeptos da “masculinidade suave” estão poupados desta jihad ideológica. Os demais, como típicos representantes de um passado que precisa ser apagado da história, são vistos sempre como violentos e machistas (pelo menos em potencial). E, caso declarem alguma inclinação ao conservadorismo, sua sentença de morte moral será decretada sumariamente.

Com o pretexto de combaterem estereótipos masculinos opressores, os que argumentam pela existência de uma masculinidade tóxica não se cansam de criar estereótipos que sempre possibilitam críticas mais abstratas para abarcarem mais indivíduos (até o ponto de poderem atacar os próprios “revolucionários” em uma conspiração que se assemelharia muito ao “Reinado do Terror” na França do final do séc. XVIII). Ao generalizarem condutas, os ativistas veem na virilidade um problema a ser execrado, mesmo que ela seja sempre necessária para a proteção da sociedade.

Dentro da nuvem de virtudes do progressismo, a abstração do homem “tóxico” não passa de uma triste vulgarização que visa uma injusta condenação do masculino. Se o feminino, por exemplo, deve ser respeitado e protegido, a virilidade é componente necessário em um mundo de imperfeições e maldades. Não é exagero algum dizer que a masculinidade tóxica é um narcótico ideológico feminista que envenena a percepção da realidade.

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João L. Roschildt

João L. Roschildt

Professor do curso de Direito do Centro Universitário da Região da Campanha (Urcamp). Além de articulista e ensaísta, é autor de “A grama era verde”. Site: www.joaoroschildt.com.br

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