A pandemia do pensamento fraco

Observando o mundo à nossa volta não fica difícil de perceber que algo se perdeu no meio de uma caminhada rumo ao sonho de uma completa humanização iluminista. Ao contrário do que muita gente pensa (e aqui a quantidade é de pessoas, não de pensamentos), a própria humanidade foi capaz de desumanizar aquele sujeito racional do Iluminismo que se emancipou justamente para cortar o cordão umbilical com um Deus que era tido como desumanizador. O caos existe, está aí para quem quiser ver. Só que muita gente (e agora a quantidade é de pessoas mesmo) se recusa a assumir a sua condição de sujeito pensante. A razão? Talvez achando que a verdade chegou. Ledo engano. 

Sei. Tudo isso está muito difícil de entender, não é? Sim, são palavras difíceis. Sei também que não é por desinteligência sua. A boa notícia, ao meu sincero e humilde juízo, é que parece que você está fora de um círculo vicioso de miséria intelectual e tirânica, pois o simples fato de você estar acompanhando esta página conservadora e lendo este texto é um sinal mais do que significativo. 

O pensamento pós-moderno vive de modas. Uma das últimas modas mais moderninhas é a do pensamento fraco. O total desinteresse por assuntos que já passaram ou por reflexões que perdurem mais do que, digamos, alguns minutinhos. Desinteresse, preguiça, autoengano e crime. 

E conservadores têm uma característica bem especial. Eles são dotados de consciência. O pensamento deles é forte.

A lição é de Russell Kirk, citando John Adams:

O conservador é um egoísta endurecido? Ele acredita no “individualismo frio” e na exclusão dos deveres tradicionais para com Deus e com o homem? Resumindo, o conservador é dotado de consciência? O radical nos diz que o conservador é um “trapo centrado em si mesmo”, mas tenho uma opinião diferente. “Não há conexão necessária entre o conhecimento e a virtude”, escreveu o saudoso John Adams. “A simples inteligência não está associada à moralidade. Que relação há entre o mecanismo de um relógio de parede ou de pulso e o sentimento de bem ou mal moral, entre o certo e o errado? A faculdade ou qualidade de distinguir entre o bem e o mal moral, assim como entre a felicidade e a miséria física, isto é, o prazer e a dor, ou, em outras palavras, uma consciência — palavra antiga, quase fora de moda — é essencial à moralidade” (Breve manual do conservadorismo).

Quem ganha com uma cultura antimetanarrativas? As manchetes mentirosas e enganadoras do pseudojornalismo, além de intelectuais que querem empurrar a história para frente, como se não houvesse passado e nem amanhã.

 A propósito do desinteresse na verdade, no conhecimento, Stefen R. C. Hicks cita Michel Foucault (um dos pensadores da nova esquerda):

Todas as minhas análises se opõem à ideia de que existem necessidades universais na existência humana”. Essas necessidades devem ser abolidas, pois são fardos do passado: “Não faz sentido falar em nome da Razão, da Verdade ou do Conhecimento — e nem mesmo contra eles” (Explicando o pós-modernismo: ceticismo e socialismo, de Rousseau a Foucault).

A tecnologia na informação e na cultura evoluiu muito desde o advento da ciência moderna. Por ela, podemos medir se nosso pensamento é forte ou fraco. Um exemplo. A Amazon permite que os seus consumidores possam acompanhar a sequencia de compra e de leitura de livros digitais do seu site. Ao analisar a minha, fico orgulhoso dela. E aqui me refiro apenas aos livros digitais, fora os físicos. Graças a Deus, ainda tem muita gente que se orgulha disso. Mas esse orgulho não é vaidade. É orgulho de uma busca do verdadeiro conhecimento, da verdade. Infelizmente, a consciência desta necessidade se perdeu junto com a “evolução” do homo sapiens. Alguns tem fé para comer carne, outros para comer legumes, adverte o “livro” mais lido do mundo. E, falando nele, não parece um paradoxo que o livro mais lido do mundo traga exatamente os desprazeres que a razão queria combater desde o seu início emancipatório? Coisas inexplicáveis, que só Deus entende. E ainda tem gente querendo explicação para tudo. Quer dizer, querem explicações para tudo desde que não haja necessidade de sair da ociosidade.

Por isso, a meu sentir, a cultura deve ser estimulada o máximo possível. É preciso que os livros saiam das prateleiras das livrarias e das bibliotecas para irem às mãos dos leitores. A Constituição Federal continua entendendo isso, tanto que imuniza os livros, jornais e periódicos da taxação de impostos.

Luis Roberto Barroso, em seu livro Sem data venia: um olhar sobre o Brasil e o mundo, com sua voz de veludo, dá a entender que são as pautas, as “verdades” relativas da modernidade e a ausência de discussão ou debate que representam a pós-modernidade o que nos toca viver. O Supremo Tribunal Federal vai “empurrando a história”, como ele mesmo diz na obra. Eis a célebre frase: “O tempo que nos toca viver”. E acrescenta: “Creia nos que buscam a verdade. Duvide dos que a encontram.” André Gide”. Então, se é assim, temos que seguir o seu conselho. Vamos duvidar de Luis Roberto Barroso.

A voz totalitária de um certo deputado federal circulou na internet por conta da quebra de sigilo da Brasil Paralelo. Ele disse que é necessário examinar quem paga a produção, quais os interesses por trás envolvidos, e, o que interessa, que eles querem “reeditar a história”.

Hã? Será que ouvi direito? Eu ouvi “reedição da história” ou estou escutando vozes?

Duas vítimas, não da COVID19, mas do pensamento preguiçoso, fraquinho, fraquinho. Vítimas cínicas, como diz Peter Sloterdijk (Crítica da razão cínica). Ou seja, são consciências falsamente esclarecidas.

Gianni Vattimo escreve no seu livro O pensamento fraco que “Deus está morto” não porque a modernidade o golpeou diretamente. Ela matou o entendimento sobre o ser, a essência, atingindo indiretamente Deus. Mente vazia oficina do diabo. É Deus que a turma inteligentinha do pós-modernismo quer matar.

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Sergio Renato de Mello

Sergio Renato de Mello

Sergio Renato de Mello, brasileiro, casado, Defensor Público de Santa Catarina, residente em Rio do Sul, Santa Catarina.

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