Entre armas e fetos

Irei estrear minha coluna no Burke Instituto Conservador, apresentando meu jeito ensaísta e provocativo de escrever, não costumo trazer uma verdade absoluta, muito pelo contrário, meu vício de escrita é sempre terminar as frases com reticências…

Pretendo provocar o pensamento dos leitores comparando o discurso que sustenta uma pauta progressista com outra pauta polêmica, porém, conservadora; ambos dizem respeito a vidas e envolve questões morais, ideológicas e até religiosas. Há um certo tempo me debruço sobre estes assuntos e percebi que ninguém comenta a semelhança entre os dois discursos, que poderiam ser tão antagônicos, mas que acabam soando como hipocrisia de quem defende o DIREITO DE ABORTAR e ao mesmo tempo é contra o DIREITO DE SE ARMAR. 

Quando monto minhas aulas de argumentação política, costumo trocar as palavras-chaves para identificar as falhas na sustentação das narrativas, observem as semelhanças destes dois discursos: 

“Nós, ABORTISTAS, defendemos a legalização do ABORTO porque é uma forma de regulamentar a prática, considerando que quando uma MULHER quer tirar um FILHO INDESEJADO ela tira de forma, legalizada ou não. ELA está DESESPERADA, precisando tomar uma atitude pessoal que pode interferir na vida de toda sua família para sempre.  Regulamentar o ABORTO evitaria que as MULHERES optassem pelo mercado negro, o que fomenta a criminalidade no país. Regularizar não significa que todo mundo sairá ABORTANDO; significa proteger AQUELAS que por infelicidade tenham que tomar essa atitude. Legalizar o ABORTO é uma questão de controle e manutenção da vida humana e não sobre matar inocentes.” 

“Nós, ARMAMENTISTAS, defendemos a legalização do PORTE DE ARMAS porque é uma forma de regulamentar a prática, considerando que quando uma PESSOA quer ATIRAR NUM VISITANTE INDESEJADO ela ATIRA de forma, legalizada ou não. ELE está DESESPERADO precisando tomar uma atitude pessoal que pode interferir na vida de toda sua família para sempre. Regulamentar o PORTE evitaria que as PESSOAS optassem pelo mercado negro, o que fomenta a criminalidade no país. Regularizar não significa que todo mundo sairá MATANDO, significa proteger AQUELES que por infelicidade tenham que tomar essa atitude. Legalizar o PORTE é uma questão de controle e manutenção da vida humana e não sobre matar inocentes.” 

Se usarmos a lógica, é completamente compreensível um armamentista ser contra o aborto, afinal, seu discurso prega defender a família a qualquer custo, seja usando uma arma, ou, seja deixando vir ao mundo um bebê não planejado.  

Contudo, um abortista ser também desarmamentista é controverso e hipócrita. Por que? 

Primeiro que no discurso abortista há o argumento da propriedade do corpo feminino (no caso do corpo da mãe), onde ela tem o direito de decidir se assumirá ou não, as consequências de um momento passageiro, então, o direito de preservar a mãe se sobrepõe à vida do filho. É exatamente assim que o armamentista pensa em relação ao invasor de sua casa, por exemplo, para “preservar a mim, vale matar outra pessoa”. Até aí tudo igual, se não fosse a questão moral acerca de quem morre. 

Para os armamentistas é aceitável matar o cidadão adulto que ameace mudar sua vida para sempre, já para os abortistas, quem deve morrer, é quem também mudaria sua vida, mas é um ser que ainda não fez mal a ninguém (e que num futuro bem próximo a chamaria de mãe), podendo se transformar no grande amor da sua vida. Não vou dramatizar a questão, não é esse meu intuito, até porque, os abortistas não compreendem o embrião como um filho, é apenas um estágio da aglomeração de células. A ideia do texto é a comparação de quem são as vítimas que serão mortas por armas e quem são as vítimas mortas pelo aborto, afinal, “todas as vidas importam”, certo? Até as mais recentes? 

No primeiro caso não há possibilidade alguma de felicidade. Atirar em alguém, (mesmo que a arma esteja legalizada) é um horror! Requer advogados, perícia, IML, corpo exposto dentro de casa, sangue coagulado no chão, gente disposta a limpar toda sujeira quando a polícia liberar a cena do crime, inquérito, investigação e audiências, até um juiz decidir que você agiu em legítima defesa e que não usou força excessiva. Sem contar o trauma e o medo da retaliação da família do morto.  

No segundo caso, há sangue, há morte, só não há as questões legais envolvidas e o trauma seria menor porque o assassino não enxerga a vítima caída ao chão e tampouco, precisa se preocupar com a família do morto, afinal, ele é a família do morto.  

Já vi grupos ABORTISTAS que usam até os índices de criminalidade para justificar o aborto. Para eles, as chances de um filho indesejado e ainda vindo de uma família disfuncional, se tornar um bandido é grande. Passagens pelas fundações de acolhimento ainda quando menor de idade, agressividade, falta de controle emocional e até desequilíbrio de sentimentos, ou falta deles, a pobreza e a falta de oportunidade os transformam em VÍTIMAS DA SOCIEDADE. Aqui entra uma questão que por mais que um abortista tente me explicar, ainda falta… É a mesma pessoa, (embrião e bandido), por que os progressistas acham que ele pode ser morto ainda no útero da mãe, mas depois que ele cresce e vira bandido, ele não merece mais punição? Mata-se quem não pensa e cuida-se de quem já sabe o que faz? A diferença está no estágio celular? Não há considerações morais, apenas biológicas? 

Parece bem cruel condenar um indivíduo sem que ele tenha tido a chance de provar que ele não será o que as pessoas esperam dele; poucas vezes vi um argumento tão carregado de pré-conceitos, sem chance de defesa, até porque o condenado nem nasceu. 

E para não andarmos em círculo, finalizo provocando um pouco mais a comparação: 

Ser vítima de uma sociedade machista e autoritária, nos dá o direito de sermos algozes numa nova sociedade feminista e autoritária? 

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As posições expressas em artigos por nossos colunistas, revelam, a priori, as suas próprias crenças e opiniões; e não necessariamente as opiniões e crenças do Burke Instituto Conservador. Para conhecer as nossas opiniões se atente aos editoriais e vídeos institucionais

Raquel Brugnera

Raquel Brugnera

Escritora e articulista política, pedagoga, pós-graduando em Estratégia Política e Marketing Eleitoral.

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