Como Lewis pode ajudar a salvar a educação brasileira

Antes de discorrer sobre como C. S. Lewis pode nos ajudar é necessário apresentar resumidamente o quadro clínico da educação nacional — até porque esta introdução nos conduzirá ao que é, penso eu, uma de suas causas obnubiladas. 

O quadro clínico

Pesquisas recentes têm preocupado os mais atentos em relação a temas da educação brasileira, pois, além de terem apontado baixos níveis de conhecimentos básicos em português, matemática e ciências, indicam haver certo desinteresse por parte dos alunos em aprender. Obviamente, não se pode enfatizar que todos os alunos estão desinteressados e que mesmo entre essa parcela o desinteresse seja unicamente o descrédito, desvalorização da vida intelectual, afinal, tal desinteresse pode ser causado por um hiato ocorrido nas suas vidas familiares, sociais, na saúde física e/ou psíquica, a exemplo do déficit de atenção e, mesmo, a superdotação. 

Agora, outro paradoxo surge ao analisar que os alunos da educação básica querem seguir carreiras científicas, como engenheiros, médicos, enfermeiros, isto é, sonham em ocupar postos importantes, mas não sabem o conteúdo mínimo necessário para isso. Mesmo entre aqueles que frequentam a escola e têm algum interesse pelos estudos, a noção do sentido do ensino está desvirtuada, ligada sempre ao êxito econômico e/ou mesmo mera obrigatoriedade, não para buscar a Verdade conforme é estimulado na educação clássica. Posto isso, quero destacar um ponto que penso ser a origem do problema educacional e descaso das gerações atuais pelo conhecimento: a falta de sentido em buscá-lo. É nesse quesito que C. S. Lewis pode nos ajudar a buscar métodos que, se servem não para curar o quadro clínico, pelo menos podem controlá-lo. 

Como fazer isso? Em primeiro lugar é necessário saber quais as causas dessa falta de sentido.

A abolição do homem

Se 1984, de George Orwell, e Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, predizem o estado desesperador a que mundo pode chegar, e infelizmente já começamos a vivenciar, o livro A abolição do homem, de C. S. Lewis, relatou o método pelo qual ambas as predições se tornaram realidade. Lewis desenvolve uma reflexão em torno das consequências do ensino de conteúdos que colocam os valores universais na relatividade e extrema racionalidade. Uma das consequências é a falta de sentido para estudar e, também, como veremos, o desrespeito pelos professores e demais figuras hierárquicas dentro do sistema de ensino — quando não, infelizmente, até os pais.

No decorrer do livro, Lewis faz sobressair três pontos, ou alicerces, nevrálgicos para uma civilização sadia e como um bom professor demonstra como tais alicerces podem ser conservados ou desconstruídos durante a educação das novas gerações — em nossos dias pode-se dizer que, até mesmo, nas mais velhas, haja vista a Educação para Jovens e Adultos (EJA) e demais programas de formação para idosos, ou seja, como um sistema educacional pode equilibrar a ordem humana ou desregulá-la. São esses os pontos: 

  1. Conscientizar os alunos de que, além deles e de seu mundo “microcósmico” imediato, existe a Lei Maior, o mundo macrocósmico existente antes de eles nascerem. Essa Lei possui regras que a sustentam e respeitá-las é conservar a maior;
  2. Uma vez educados conforme a Lei, os alunos compreenderão e valorizarão os esforços das gerações passadas quanto aos estudos e construções da sociedade segundo aquela, cientes de que, negado esse fato, comportar-se-ão como caipiras cronológicos, segundo ensina o professor Monir Nasser; e
  3. Educá-los para ter afeições ordenadas, ou sentimentos justos, estando aptos para o estudo, o entendimento e a prática da Ética; esse treinamento evita a formação de indivíduos “primatas civilizados” e/ou “mesquinhos”, como veremos adiante. Afeições ordenadas, mencionadas por C. S. Lewis, referem-se à ordo amoris de Santo Agostinho, na qual cada elemento dota de um grau de afeição apropriado.

Esses são os três pontos que, se bem trabalhados, em longo prazo ajudarão a salvar a educação do Brasil. Os valores universais não podem ser postos ao crivo do relativismo e do racionalismo exacerbado. Se isso for feito, se relativizarmos os sentimentos que diferenciam, por exemplo, o Belo do Feio, o aluno, mesmo que inconsciente, levará para si durante a vida um entendimento de que todas as opiniões de valor são meras expressões subjetivas do emissor e, por serem expressões da emoção de terceiros, carecem de importância. Isso é apresentado por meio do primeiro exemplo do livro, que consiste na passagem de uma história conhecida, quando Coleridge estava junto a uma queda d’água e ali havia dois turistas, sendo que um, ao ver a cachoeira, disse “Isso é sublime”, ao que o outro julgou ser bela e não sublime. Os autores, Gaio e Tito, disseram que, na verdade, a cachoeira não era sublime, mas sim que os sentimentos desse contemplador específico era sublime. Logo, ele poderia, ou deveria dizer, “Na minha cabeça, os meus sentimentos têm a ver com a palavra sublime”. Lewis, nesse ponto, explicou haver muitas questões envolvidas e até bem profundas, uma delas é a consequência mencionado anteriormente. Entretanto, ele cita que os autores continuaram desenvolvendo essa ideia, a saber: “Tal confusão permanece presente em nosso linguajar cotidiano. Parece que estamos dizendo algo muito importante sobre alguma coisa; quando, na verdade, estamos apenas dizendo algo referente aos nossos próprios sentimentos” (grifos da autora). 

Bem, com relação à queda d’água, o professor primeiro buscou dirimir a confusão, segundo ele, gerada pelos autores. Ora, na verdade os sentimentos que uma pessoa tem diante de algo sublime, se forem reduzidos ao simples racionalismo, são correlatos à veneração; logo, se fosse expressar o que sentia, ela diria “Tenho sentimentos humildes” e não “sublimes”, porque estava em estado de veneração, como dito. Obviamente, os autores não disseram isso literalmente e tampouco incutiram essa teoria na mente dos alunos, mas também não expuseram nenhum obstáculo, ou seja, outros exemplos com conceitos contrários para que os alunos assim deduzissem. Mas veja como o relativismo e o racionalismo são incutidos por meio desse material escolar específico; imagine que nesse contexto era apenas uma transição da educação clássica para a moderna. Que dirá hoje?

Os alunos não são incapazes de raciocinar e chegar a suas próprias conclusões. Se não existem sentimentos mais nobres do que outros, por que terão de aceitar humildemente e suportar o processo dolorido de assumir a sua culpa indelegável? Se não existe uma ordo amoris, provavelmente qualquer emoção convirá conforme cada situação e segundo seus desejos esporádicos. Quando se excluem os valores universais e sua objetividade, mas se deixam ao bel prazer as emoções, corremos o risco da regressão da humanidade a um estado primitivo, afinal, não podemos esquecer que nós temos uma parte bestial em nosso cérebro, o cérebro reptiliano/basal. Somente pelas partes racional e emocional (equilibradas) é que tal tendência bestial é controlada e, conforme o dr. Minh Dung Nghiem, a educação civilizatória com valores é a única capaz de tal empreendimento. Se com essa formação já é difícil manter o homem são, imagine sem? Se, segundo o testemunho hebraico de Gênesis 4:7 o próprio Deus, tido como a Fonte da Lei pelos judeus e cristãos, admoestou Caim sobre a besta-fera que estava para dominá-lo e mesmo assim Caim cedeu ao impulso violento; imagine uma sociedade em que desmerece Deus e sua Lei por considerá-los meras subjetividades, nada racionais ou científicos?

Prosseguindo com a análise do material, Lewis inseriu no livro como segundo exemplo um trecho no qual os autores continuam no mesmo sentido de desprestigiar as emoções, citando uma propaganda qualquer sobre um cruzeiro marítimo, cuja redação alude a uma experiência especial tida por uma personagem importante da história inglesa, até, segundo Lewis, de qualidade superior à da propaganda que, para ele, era “tola”. O problema situa-se quando Gaio e Tito ensinam aos alunos que tais emoções jamais serão sentidas e que tais sensações reais, durante essa viagem, poderiam ser obtidas por meio de outros tantos passeios marítimos em outros mares pelo mundo sem ser aquele da propaganda. Claro que Lewis entende ser um dos principais objetivos de tal instrução precaver os alunos quanto às manipulações da mídia publicitária, porém, o grande erro foi não terem colocado ao lado desse mau exemplo de literatura trechos de obras literárias superiores, cujas emoções, inseridas de forma banal nessa mensagem panfletária, recebem tratamento e aplicações dignas e muito superiores, ou seja, são usadas de forma correta. Os alunos aprenderiam a diferença entre uma péssima redação e uma de nível excelente, passando a distinguir o bem do mal; “Haveria nela algum ‘sangue e seiva’ — árvores do conhecimento e da vida crescendo juntas. E ainda com o mérito de ensinar literatura; assunto no qual Gaio e Tito se mostram, apesar de seu professo propósito, excepcionalmente tímidos”.

Também nesse exemplo, como não apresentaram nenhum conteúdo que expusesse a boa colocação dos mesmos sentimentos em literaturas de qualidade, corre-se o risco de fomentar a formação de primatas civilizados, ou seja, aqueles homens que até sabem haver um determinado oceano por onde trafegam navios, porém, para eles tal local nada mais é do que um monte de água salgada e gelada, desmerecendo maior consideração. São pessoas que receberam certa instrução, mas que esta careceu de “sangue e seiva”, isso porque, conforme Lewis, no conteúdo exemplificado aqui não foi oportunizada aos alunos a observação de que, mediante tal propaganda, existem dois tipos de pessoas: as que estão acima desta mensagem medíocre e as que estão abaixo. As primeiras são aquelas que sabem dar valor para objetos, elementos, que merecem tais valorações, a diferença entre uma boa e má literatura — para o que eles deveriam ser educados e não foram. As segundas são os primatas civilizados já mencionados e que, provavelmente, os alunos tenderão a tornar-se, considerando que receberam unicamente a lição de que toda a literatura dotada de emoções desmerece atenção e valor e, em consequência, demais elementos do mundo real.

A seguir, nas páginas 17-19, no penúltimo exemplo, o professor cita outro autor nomeando-o com o pseudônimo Orbílio, que deprecia — novamente citando um conteúdo “tolo”, nas palavras de Lewis — os valores atribuídos aos esforços dos cavalos, nesse trecho específico do “livreto”. No caso, Orbílio diz que, quando determinado autor louva em seu escrito os cavalos “(…) por serem ‘servos voluntários’ dos antigos colonos da Austrália”, ele não fala algo estritamente objetivo, importante, algo que realmente sucede na realidade, conduzindo os alunos para a dedução qual os cavalos não estão “(…) secundum litteram, interessados na expansão colonial”. É claro que tal literatura não é, conforme ensina Lewis, de alto nível e coerente, porém, os alunos deveriam ter tido a oportunidade de conhecer exemplos de alta literatura, a qual tem a mesma aplicação dos valores atribuídos às atividades citadas naquele trecho, porém, de forma digna; o professor cita possíveis exemplos: 

Ele não diz uma só palavra a respeito de Ruksh e Sleipnir, nem sobre os corcéis lacrimejantes de Aquiles, nem dos cavalos guerreiros do livro de Jó — nem mesmo do Irmão Coelho das fábulas infantis de Pedro, o Coelho —, nem da pré-histórica piedade dos homens pelo “nosso irmão boi”, de nenhum desses tratamentos semiantropomórficos que damos aos animais na história da humanidade e na literatura, onde quer que eles encontrem expressões nobres ou mordazes. Nem mesmo dos problemas da psicologia animal, conforme abordados pela ciência, ele fala (…) (grifos da autora).

A questão crucial é que Orbílio critica o uso sentimentalista, tido por ele como não existente na prática, porém, sem apresentar exemplos em que essas mesmas emoções, atribuídas aos esforços dos cavalos guerreiros, são aplicadas na literatura de forma superior, correta, digna, e sem mesmo contrastá-las, não somente com o trecho específico sobre a colonização, mas inclusive com outros semelhantemente ruins, como o professor sugere quando diz “expressões nobres ou mordazes” para que realmente os alunos assimilem a diferença entre uma e outra, entre o Bem e o Mal. Surge uma observação interessante do professor sobre a consequência de retirar o valor dos sacrifícios e papéis relevantes dos animais. 

  1. S Lewis alerta que, sem mostrar exemplos na literatura, principalmente clássica, de dignas participações dos animais, a exemplo dos cavalos, por meio das quais os alunos entenderiam haver situações adequadas para uso daquelas mesmas emoções — que não na péssima literatura —, os alunos perderam a grande oportunidade de suas vidas — visto que eram jovens das séries finais e, portanto, aprendizes em fase de formação — de aprenderem sobre mais dois tipos de homens, a saber: aquele que “(…) conhece cavalos e os ama, não como ilusões antropomórficas, mas com amor comum; e o irremediável e mesquinho homem urbano, para quem um cavalo é um mero meio de transporte antiquado”. Não tendo aprendido essa considerável diferença, 

Os alunos terão perdido qualquer prazer em seus pôneis e cachorros; terão recebido certo incentivo à crueldade ou à negligência; e terão aprendido a ter prazer na própria sabedoria. Essa é a lição do dia que eles teriam recebido em língua inglesa, embora não tivessem aprendido nada de inglês.

Ao fim desses três exemplos, surgem dois tipos de personalidades formadas: o primata civilizado e o mesquinho. Já conhecendo esses dois tipos, pode-se supor que, juntando ambos e aplicando-os ao exemplo do tema aqui tratado, o apreço pelo conhecimento, não será demais presumir que poderá existir um determinado indivíduo primata civilizado e mesquinho que saiba da existência de obras literárias e artísticas clássicas mas as despreza por julgá-las algo que simplesmente existe, porém, sem importância e ultrapassadas. 

Nota-se, a partir dos exemplos supracitados, o perigo da depreciação da Lei, ou o Tao, como Lewis cita na obra. Não haverá sentido em preservar o amor ágape, benevolência, sacrifício, justiça, tradição, etc. Em decorrência disso, em longuíssimo prazo começarão a surgir indivíduos que não só escarnecerão de todo o patrimônio cultural histórico e sua importância (que é — era para ser— transmitido pela educação), mas também levarão tal postura consigo no seu cotidiano: diante dos professores, diretores, orientadores, conselheiros tutelares, pais, avós, policiais, juízes, etc., afinal, o juízo de valor a respeito das figuras hierárquicas da sociedade é subjetivo. Ainda que se diga haver a questão pragmática do Bem, Lewis nos alerta de que essa linha de pensamento não fará sentido e não solucionará o problema porque, simplesmente, não tem condições de preencher o vazio deixado uma vez retirada a Lei. Pelo contrário, conduzirá a humanidade para o Grande Irmão, o Inovador, em suas palavras. Como?

Depois de expor os exemplos no livro, o autor, para mostrar a consequência, em certo modo, mais preocupante coloca uma situação-problema hipotética em que já não existirão os valores universais absolutos. A situação hipotética é a seguinte: a espécie humana está em risco a não ser que haja uma luta em prol de sua perpetuação. Assim, é necessário ir à guerra em prol da sobrevivência da espécie humana, porém, nem todos deverão guerrear sob o risco de, logicamente, todos os humanos da Terra morrerem. Logo, faz sentido que apenas poucos tenham de arriscar suas vidas em lugar de outros, para que a espécie humana se perpetue; será um sacrifício. É nesse ponto que o autor cria a personagem chamada Inovador, quem buscará resolver a situação sem o uso das emoções: honra, amor, orgulho, dignidade, crença, e serão três as opções ordinariamente seguidas: razão, instinto e acaso. 

Não é o objetivo deste artigo discorrer detalhadamente sobre a aplicação e os efeitos de cada opção. A intenção é apresentar como os três pontos elencados no início são importantes e como foram e são depreciados, ocorrência que surtirá resultados nada bons. Alguns já foram mencionados, os demais serão brevemente tratados agora e mostrarão como a linha pragmática também não resolverá a falta da Lei.

Citemos a Razão; para justificar a ida de alguns para a guerra, a fim de morrerem no lugar de outros, surge um dilema óbvio: tão logo, com uma sociedade despossuída de valores, apareceria um revide com indagações semelhantes: “Por que eu deveria ser um daqueles a assumir o risco?”; afinal, não é racional morrer sendo que o outro, o próximo, poderia fazê-lo no seu lugar. Dessa feita, o Inovador daria por si, ao entender, que a recusa de sacrifício não é mais e nem menos racional do que o consentimento e refletiria sobre até que ponto o egocentrismo é mais “racional” ou “inteligente” do que o altruísmo. Obviamente, tendo caído numa situação complicada, evitando recorrer aos antiquados valores, o Inovador recorreria a algo mais palpável ante a pura e complexa Razão: encontraria o Instinto. Entretanto, mesmo essa opção não surtirá os efeitos desejados, porque os revides e contradições também aparecerão, a exemplo da pergunta: “Quais instintos são melhores do que outros? E quais são mais racionais?”. Eis a nova proposta que, outra vez frustrada, dará vez ao Acaso: a sujeição dos homens pela Natureza.

Nesse estágio, a sociedade já teria categorizado muitos fenômenos da natureza, mensurando-os, dissecando-os e mesmo recriando-os ao ponto de querer fazer o mesmo para a origem dos juízos de valores: a mente humana.

Esse Tao, que aparentemente devemos tratar como um dado absoluto, é simplesmente um fenômeno como outro qualquer (…) é claro, enquanto não sabíamos como funciona a mente, aceitávamos essa mobília mental como um dado, até mesmo como um mestre, mas muitas coisas da natureza que outrora foram nossos mestres tornaram-se nossos mestres. Por que não a mente? Por que nossa conquista da natureza precisa ser interrompida em reverência estúpida a esse bocado derradeiro e mais poderoso da “natureza” chamado, até agora por convenção, de consciência do homem?

A questão nesse caso é, uma vez retirados todos os juízos de valor e todos os sentimentos que os sustentam e levados à extrema objetividade, haverá lacunas em torno de quais fenômenos da natureza humana são saudáveis para a sociedade; a partir de então deverá ser estudado e discutido, por exemplo, o que é o Bem e o Mal. Entretanto, como já mencionado, todos os conceitos que até então sustentavam e cabiam para determinadas “palavras” são, nesse caso hipotético, esvaziados, retirados, afinal, são subjetivos. São contrários àquela objetividade científica racional tão almejada pelo Inovador. Desse modo será preciso criar novos conceitos objetivos e aí Lewis chega a um dos ápices de seu livro, no qual diz que o único “dizer”, “julgar” que não perece para a subjetividade é o “eu quero”; querer é objetivo, em contrário ao “isto é bom; penso que isto seja melhor porque…”. 

Será a entrega do homem para suas vontades “objetivas” vazias dos valores “subjetivos”; o homem se dará à mercê para a sua própria natureza recém-conquistada: os seus impulsos, isto é, o Acaso (Natureza). A antiquada civilização será substituída pelo cérebro basal, natural do homem, e novamente poderá ser que, a depender do Acaso que sobrevenha ao Inovador, ele decida objetivamente ser desnecessário garantir a posteridade da espécie.

E assim, tendo demonstrado sucintamente as três formas de solução para a situação hipotética, vale colocar o ponto em comum em todas elas: retirando do homem a capacidade de se autogovernar, autocontrolar, por meio dos valores morais absolutos, para que haja uma ordem mínima na sociedade, deverão ser criadas leis que determinem como os indivíduos devem se comportar. O problema é que as leis são feitas por homens que estão fora do Tao, que menosprezam os valores, a fim de controlar uma massa de homens. Lewis diz que não deseja dizer enfaticamente que tais homens serão maus, porque nesse estágio de consciência eles sequer serão humanos para poderem, talvez, ser considerados bons ou maus. Uma pessoa é humana quando está dentro do Tao, da Lei, e não fora dele, caso contrário já será considerada corrupta. Também, se os legisladores, aqui representados pelo Inovador darão vez para o fenômeno objetivo da “benevolência” isso não se sabe, entretanto, o autor faz um alerta irônico mencionando que dificilmente houve na história um homem que tenha chegado no poder, e sem virtudes, tenha dado vez à benevolência.

Isso tudo são as consequências da rejeição do Tao, ou da Lei, dentro da educação, formação dos indivíduos. Lembrando que não é somente a escola que educa, mas também tudo aquilo que influencia e, aqui, refiro-me especialmente à mídia (cinema, TV, músicas, publicidade). O que temos consumido de mídia? O que as famílias conservadoras têm assistido e ouvido? O professor Gilbert Highet fala sobre isso no livro A arte de educar e, também, é sugerida a leitura do artigo “Fracos, incapazes e depravados”, escrito por Igor Moreira Celestino, publicado no site Burke Instituto Conservador, em que é desenvolvida uma reflexão sobre o papel formador dos desenhos animados. 

Retornando para o contexto estritamente discutido, a educação brasileira, o que podemos fazer para preservar os três pontos defendidos por C. S. Lewis?

Primeiramente, talvez, seja bom seguirmos o testemunho de vida do professor: preparação intelectual sólida (e constante) e ação nos momentos necessários. Lewis era bem preparado intelectualmente, imagino que lia obras clássicas nos originais gregos e latinos. Não só foi instruído na lógica como exercitou-a e aplicou-a às suas obras apologéticas. Preparação intelectual e Ação. No que agir? E como agir? Há muito que fazer, no que agir. 

Cito duas sugestões práticas: 

  1. Colaborar e ajudar os professores que estão desgastados. Os das escolas públicas estão cansados porque, fora a falta de investimento, podendo ser causada, por vezes, pelo desvio de recursos financeiros, há a depredação dos materiais didáticos e mobiliários escolares. Assim, acaba que muitos precisam comprar com o próprio salário os livros e demais recursos, incluindo até mesmo armários. Sem falar dos roubos noturnos às escolas. São fatores que desgastam, de modo que nós, como pais e/ou parentes próximos de alunos, podemos propor ajuda aos nossos queridos professores.
  2.  Como sabemos, toda prática é inspirada pela teoria. Antes da ação vêm as ideias, as propostas intelectuais que dirigem o comportamento dos homens (ADLER & VAN DOREN, 2010; GILSON, 2010). Logo, podemos agir averiguando os documentos que norteiam os sistemas educacionais do nosso Estado e município. Quais são os livros, escritores usados como fonte de fundamentação pela Secretaria da Educação Estadual, ou, Municipal de onde você reside? Quais os intelectuais mencionados nas Propostas Curriculares? Em Santa Catarina, por exemplo, nas Propostas Curriculares do Estado, referentes aos anos de 1998 e de 2014, são citados Antonio Gramsci e Karl Marx… Se esse é o seu caso, podemos começar propondo a abertura desses documentos, a sua democratização, mediante a inserção de intelectuais conservadores; C. S. Lewis poderá ser um deles.

Certamente, há muito que estudar e fazer para a conservação e, de certa maneira, recuperação dos alicerces sobrepujados da obra clássica A abolição do homem, do querido professor C. S. Lewis.

Gostou desse artigo? Apoie o trabalho do Burke Instituto Conservador virando um assinante da nossa plataforma de cursos online.

As posições expressas em artigos por nossos colunistas, revelam, a priori, as suas próprias crenças e opiniões; e não necessariamente as opiniões e crenças do Burke Instituto Conservador. Para conhecer as nossas opiniões se atente aos editoriais e vídeos institucionais

Compartilhe

Compartilhar no facebook
Facebook
Compartilhar no twitter
Twitter
Compartilhar no whatsapp
WhatsApp
Compartilhar no email
Email

Comentários

Relacionados